Povos tradicionais, a governança ambiental e a sustentabilidade: os geraizeiros norte-mineiros
Os povos originários e tradicionais do Brasil, como indígenas, quilombolas e os geraizeiros do Norte de Minas Gerais, enfrentam desafios constantes para a preservação de seus modos de vida, culturas e territórios. Apesar de algumas garantias constitucionais, muitos desses grupos ainda sofrem com a falta de reconhecimento legal e ameaças ambientais e climáticas que comprometem sua existência.
O conflito entre regimes jurídicos
A legislação brasileira nem sempre foi clara ou eficiente na proteção dessas comunidades. O país é signatário da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que determina a proteção dos povos tribais, mas, na prática, as normas nacionais nem sempre garantem a segurança jurídica necessária. Isso cria lacunas e inconsistências que dificultam o reconhecimento e a defesa dos direitos desses grupos.
A Constituição de 1988 representou um avanço ao reconhecer os direitos dos povos indígenas e, em menor escala, dos quilombolas. No entanto, povos como os geraizeiros – tradicionais habitantes do cerrado mineiro – ainda enfrentam dificuldades para terem seu modo de vida protegido de forma eficaz.
Ameaças ambientais e conflitos territoriais
As principais ameaças enfrentadas por esses povos incluem a expansão agrícola e mineradora, que avança sobre territórios tradicionalmente ocupados por essas comunidades. No caso dos geraizeiros, grandes monoculturas de eucalipto e projetos de mineração têm provocado desmatamento, conflitos por terra e pela água, além da destruição de modos de vida sustentáveis.
A grilagem de terras e a fragilidade da governança pública tornam a situação ainda mais crítica. Muitas áreas ocupadas por geraizeiros são consideradas terras devolutas pelo Estado, permitindo que sejam negociadas com grandes empresas sem a consulta ou consentimento das comunidades locais.
O caso dos geraizeiros norte-mineiros
Os geraizeiros estão em comunidades tradicionais que vivem no Norte de Minas Gerais, região do cerrado marcada por extensos chapadões e áreas de vegetação nativa. Ao longo dos séculos, esses povos desenvolveram um modo de vida sustentável, baseado na agricultura familiar, na coleta de frutos do cerrado e no uso racional dos recursos naturais. No entanto, a expansão da monocultura de eucalipto e a chegada de empreendimentos mineradores têm ameaçado sua existência. A grilagem de terras e a falta de reconhecimento legal colocam os geraizeiros em uma posição vulnerável, muitas vezes impedindo seu acesso a territórios historicamente ocupados por suas comunidades.
Além da questão fundiária, os geraizeiros enfrentam desafios relacionados à preservação de suas tradições culturais e conhecimentos ecológicos. A substituição da vegetação nativa por culturas de grande escala altera drasticamente o equilíbrio ambiental, secando nascentes e reduzindo a biodiversidade local. O desmonte desses ecossistemas compromete não apenas o sustento dessas comunidades, mas também impacta negativamente o clima e os recursos hídricos da região. Diante desse cenário, torna-se fundamental o fortalecimento das políticas públicas de proteção territorial e a implementação de medidas que garantam a autonomia e os direitos dos geraizeiros frente às ameaças ambientais e econômicas.
Governança e sustentabilidade
A questão da governança, tanto pública quanto privada, é essencial para garantir os direitos desses povos. O Estado tem o dever de respeitar e aplicar a Convenção 169 da OIT, além de regulamentar e fiscalizar os empreendimentos que impactam diretamente essas populações. Ao mesmo tempo, empresas que atuam nessas regiões devem adotar práticas mais responsáveis, levando em conta a sustentabilidade ambiental e os direitos sociais.
A proteção dos conhecimentos tradicionais dessas comunidades também deve ser prioridade. Os saberes sobre manejo sustentável da biodiversidade e os modos de vida tradicionais oferecem alternativas para a preservação ambiental e podem contribuir para soluções diante da crise climática global.
O futuro dos povos tradicionais
A luta pelo reconhecimento legal e pela proteção dos povos originários e tradicionais continua. Movimentos sociais, pesquisadores e entidades vêm trabalhando para ampliar a visibilidade dessas questões e pressionar o poder público para ações mais efetivas.
Garantir os direitos dessas comunidades não é apenas uma questão de justiça histórica, mas também uma estratégia fundamental para a conservação ambiental e a construção de um modelo de desenvolvimento mais sustentável para o país. O respeito à diversidade cultural e à relação dessas populações com a natureza pode ser um caminho essencial para um futuro mais equilibrado e inclusivo.
Conclusão
A defesa dos direitos dos povos originários e tradicionais não é apenas uma demanda dessas comunidades, mas uma responsabilidade coletiva da sociedade e do Estado. A preservação de seus territórios e saberes não só garante sua sobrevivência, mas também contribui para um modelo de desenvolvimento mais sustentável e consciente. Proteger esses grupos é, portanto, uma forma de preservar a diversidade cultural e ambiental do Brasil, assegurando um legado para as futuras gerações.
Publicado originalmente em 14/02/2025 em https://professorlevon.home.blog/2025/02/14/os-povos-tradicionais-a-governanca-ambiental-e-a-sustentabilidade/
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